Código Penal Comentado Art. 5°

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DIREITO PENAL COMENTADO

Livancler de Oliveira

8/25/20254 min read

a statue of a woman with a flower in her hand
a statue of a woman with a flower in her hand

Art. 5º - Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.

Este artigo reafirma o princípio da territorialidade da lei penal brasileira. Isso significa que todo crime cometido dentro das fronteiras do Brasil – incluindo seu espaço aéreo e mar territorial – será julgado pelas leis do país, independentemente da nacionalidade do autor ou da vítima.

Existem exceções, como os casos de imunidade diplomática (para embaixadores e cônsules de outros países) ou situações previstas em tratados internacionais dos quais o Brasil seja signatário. Mas a regra geral é clara: o território brasileiro é um espaço soberano, e quem comete um ato ilícito aqui está sujeito à nossa Justiça.

Por exemplo:


Um turista francês que furtar uma joia em uma loja em São Paulo será processado e julgado pela Justiça brasileira, seguindo as regras do nosso Código Penal. O fato de ele ser estrangeiro não o isenta de responder pelo crime aqui cometido.

O Turista e a Estatueta

O sol do Rio de Janeiro parecia derreter o calçamento de pedra portuguesa da Praia de Copacabana. Entre a multidão de turistas de todos os cantos do mundo, Klaus Berger, um austríaco alto e de cabelos lojos quase brancos, aproveitava suas férias. Encantado com o Brasil, ele passava os dias conhecendo pontos turísticos e comprando lembranças para a família.

Sua última parada foi uma pequena loja de antiguidades no Centro, cheia de objetos empilhados e com um aroma forte de madeira envernizada. Foi ali que seus olhos azuis se fixaram em uma pequena estatueta de madeira, entalhada à mão, representando um orixá. O preço, however, pareceu-lhe absurdo.

O dono da loja, o Seu Alberto, um homem já idoso e de modos tranquilos, explicou com paciência: "É peça única, senhor. Artesanato do século passado. Valor histórico."

Klaus, acostumado a regatear nos mercados de Viena, tentou baixar o preço, mas Seu Alberto foi irredutível. Frustrado e com a sensação de estar sendo passado para trás por ser turista, Klaus teve um impulso irracional. Enquanto Seu Alberto se virava para atender outro cliente, ele pegou a estatueta e a enfiou rapidamente dentro de sua mochila.

Ele não contava com a visão apurada de uma vendedora adolescente, neta de Seu Alberto, que observou tudo do balcão do fundo. Sem alarde, ela enviou uma mensagem rápida para o avô. Quando Klaus se virou para sair, fingindo naturalidade, encontrou Seu Alberto parado na porta, com um olhar triste, não de raiva, mas de decepção.

"O senhor esqueceu de pagar pela peça, amigo", disse o velho homem, calmamente.

Klaus, pego em flagrante, corou. "Ach... É um mal-entendido! Eu só estava... examinando melhor", gaguejou, em um português carregado de sotaque.

Poucos minutos depois, uma viatura da Polícia Militar chegou ao local. O soldado Ramos, um carioca da gema, ouviu a versão de Seu Alberto e de sua neta. Klaus, cada vez mais nervoso, insistia: "Isto é um absurdo! Sou cidadão austríaco! Vocês não podem me prender. Isto vai virar um incidente diplomático! Vou ligar para o consulado!"

O soldado Ramos, com a paciência de quem já lidou com muito turista achando que as leis do país não se aplicam a ele, apenas anotou os dados em sua caderneta.

"Senhor Klaus, o senhor está no Brasil. Aqui, a lei é uma só para todos. Furto é crime, não importa se o dono da loja é brasileiro, se a vítima é austríaca ou se o ladrão é marciano. Aconteceu aqui, cai sob a lei daqui."

Klaus foi conduzido à delegacia para prestar depoimento. Na sala de interrogatórios, a Dra. Beatriz Costa, uma delegada jovem mas com autoridade inquestionável, explicou a ele a fundação legal daquela situação.

"Sr. Berger", disse ela, segurando uma cópia do Código Penal. "O senhor cometeu um furto, crime previsto no artigo 155, em território nacional. O Art. 5º deixa muito claro: a lei brasileira se aplica a qualquer crime cometido dentro do nosso território. A sua nacionalidade é irrelevante para este fato."

Ela ergueu a mão para conter seu próximo protesto. "Isso não significa que desrespeitaremos seus direitos. Você terá um tradutor, poderá contactar o consulado austríaco – o que é um direito seu por regras de direito internacional – e terá amplo direito de defesa. Mas a jurisdição, a competência para julgar o que aconteceu dentro dessas fronteiras, é nossa. Esse é um princípio básico da soberania de qualquer nação."

Klaus, que esperava uma solução rápida com uma ligação para uma autoridade superior, sentou-se, atordoado. A realidade era bem diferente daquilo que ele via em filmes. Não havia "passagem livre" para estrangeiros.

O desfecho foi rápido. Como era primário e o valor do objeto era relativamente baixo, Klaus foi liberado após assinar um Termo Circunstanciado e se comprometer a comparecer à Justiça. A estatueta foi devolvida a Seu Alberto, que, num gesto de magnanimidade que só um bom carioca tem, disse não querer prosseguir com a queixa se Klaus se desculpasse e pagasse pelo objeto.

Envergonhado e aliviado, Klaus pagou. Antes de sair, o soldado Ramos deu-lhe um conselho amigo: "Em todo lugar do mundo, moço, o que rege as ações das pessoas é a lei da terra. Aqui não é diferente. Aproveite o resto das suas férias, mas aproveite dentro da lei."

Klaus saiu da delegacia não apenas com uma lição sobre o artesanato brasileiro, mas com um profundo respeito pelo Art. 5º e pelo princípio que sustenta a ordem em qualquer país: dentro de suas fronteiras, sua lei é soberana. A justiça, afinal, tem endereço certo.